Luciana Araujo Lumyx
VIDA. Palavra curta, parece uma sigla. Por pouco não me tornei a chave, a porta da passagem nessa noite. O sinal abriu e saí rápido com o carro: estava na pole position. Primeira, segunda marcha, terceira. Ainda tenho tempo de ver alguém dando saltinhos na calçada à minha direita. Súbito, por detrás de um ônibus, surge um vulto correndo na frente. Leve, arisco, claro. Talvez (um anjo e) mais alguém. TUM! Bate contra a lateral esquerda e voa em parábola, rebatendo no capô do lado direito, enquanto freio de susto. Chão. Respira, criatura! O que houve?
Olho pra trás, ela no chão. Paro
o carro no cantinho e corro para perto. Uma moça, caída de lado no asfalto, é
amparada pela amiga, a tal que pulava do lado de cá da rua, gritando para que
não atravessasse. Mas - agora é tarde - ela chispando ignorou o aviso,
aventureira, esquecendo de olhar. Deitada no chão, ela tenta sorrir. "I'm embarassed! It was so my
fault!" - me diz num inglês britânico. Achou que era mão única!
E cobre o rosto com o moleton, numa atitude moleca. Penso: "meu deus, isso
importa?" Please - eu digo - it doesn't matter! Are you all right? -
como se fosse possível estar. A multidão se reúne, aconselha coisas. Não deixa
ela levantar! Espera a ambulância! Ela diz que só tem dor na perna, eu tenho medo.
O moço do ponto de taxi me tranquiliza: "ela foi afoita, atravessou feito
louca. Você não podia fazer nada! O motorista do ônibus disse que se precisar
testemunha dizendo que não foi sua culpa". De novo, papo de culpa. E ela
ali deitada. Duas garotas, devem ter 20 anos. Elas me contam que são
enfermeiras, vieram da Inglaterra para um estágio no Pró-Cardíaco. Eu penso que
ela pensa que sabe diagnosticar se está bem só porque é enfermeira! Mas ela
parece bem. Hannah é o nome dela. Um palíndromo!
Sua coluna dói? Só a perna? Mora em
Birmingham. Perto da minha mãe. Ambulância, maca. Pedem: "explica para ela
que vamos virá-la de decúbito dorsal". Nem dá tempo. Com o movimento, a
dor aparece, ela grita MUITO de dor. Imobilizador, aquele quadrado aparafusado
em volta da cabeça. Que medo - eu grito por dentro - será a coluna? Ela vai na
maca, enquanto falo com os policiais escuto dizerem: "desconfiam que tenha
fraturado a bacia". Pesadelo. Estou no meu bairro, me sinto em casa. E
ela??? Foi-se a ambulância......................Pego o carro, adrenalina
reversa.
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